terça-feira, 10 de setembro de 2013

Contribuição do grupo de mulheres Pão e Rosas para o I Encontro Nacional do Movimento Mulheres em Luta.

Reproduzimos abaixo nossa contribuição encaminhada ao I Encontro Nacional do Movimento Mulheres em Luta, que ocorrerá nos dias 04,05 e 06 em Minas Gerais, que reunirão diversas mulheres de todo o Brasil para discutirmos em meio as explosões de protestos e de politização em nosso país, qual deve ser nosso plano de luta e nossa organização para avançarmos em nossa luta por nossa completa emancipação.





Saudações companheiras!

Nós, militantes do grupo Pão e Rosas Brasil gostaríamos, antes de tudo, saudar a iniciativa do Movimento Mulheres em Luta de organizar este Encontro Nacional de seu movimento, com mulheres trabalhadoras e estudantes após a convulsão de atos, manifestações e a politização generalizada fruto das grandes mobilizações de junho que incendiaram nosso país. A aliança de trabalhadoras e jovens nestes dias 4, 5 e 6 serão fundamentais para conseguirmos conquistar nossos direitos, passando por cima das direções dos sindicatos atreladas aos governos e aos patrões, como CUT, CTB, UGT, Força Sindical e outras, que desde junho não fizeram nada para forjar essa aliança e depois nos dias 11 de julho e 30 de agosto ficou claro o papel de freio que quiseram impor (sem convocar assembleias, tirar delegados de base, sem organizar nenhuma mobilização séria) aos trabalhadores e trabalhadoras, que claramente gostariam de não só mais apoiar, mas também ir às ruas e retomar seus próprios métodos.

Junho retomou o espírito de luta que há muito tempo não se via. Ficou claro que somente indo para as ruas, lutando contra os governos e contra os grandes empresários é que podemos conquistar questões elementares para nossas vidas. Por isso, esse encontro que acontecerá em Minas Gerais, que vem sendo palco de assassinatos brutais a travestis e homossexuais, precisa servir para realmente termos um plano de lutas a nível nacional para arrancar nossos direitos e lutar contra estes sistema de opressão e exploração, o que somente se dará enfrentando os patrões, os governos como o do PT com uma mulher è frente e suas burocracias sindicais.
Nesse sentido, gostaríamos de nessa pequena contribuição apontar elementos que possam nos ajudar a nortear a construção desse plano de luta para que seja eficaz e nos faça triunfar. Partimos de que a opressão que nós mulheres, travestis e transexuais vivemos são fruto do desenvolvimento humano baseado na propriedade privada e na dominação do homem sob a mulher para garantir assim, o direito a herança a seus descendentes. Que no sistema capitalista, se aprofundou com novos elementos de opressão, ainda que mantenha exatamente esse atrelamento com a propriedade privada, tornando-se um pilar importantíssimo desse sistema sócio-economico-político.

Por isso é preciso encararmos esse encontro a partir de uma perspectiva de classe, desde uma aliança da juventude universitária e secundarista com as mulheres trabalhadoras, que sofrem com a dupla (quando não tripla) jornada de trabalho, por conta da falta de serviços públicos. Que sofrem com a violência doméstica e a precarização do trabalho (estando nos piores postos de trabalho como a terceirização ou ainda a prostituição, como no caso da maioria das travestis e transexuais). E que ainda que as opressões perpassem todas as classes sociais, entendemos que nosso combate a opressão precisa estar completamente associado a luta anticapitalista e antigovernista. Nesse sentido, não nos basta apenas exigir do governo nossas demandas, mas que consigamos construir um forte movimento de mulheres que não se ilude com Dilma, Cristina Kirchner (presidente da Argentina), ou qualquer outra mulher que defende os empresários e a manutenção desta sociedade. Queremos um forte movimento de mulheres que lute não somente pelos nossos direitos, mas por uma nova sociedade.

Outro debate que avaliamos como muito importante é em relação qual programa devemos defender para acabar com a violência “doméstica”. Acreditamos que a exigência de mais delegacias de mulheres (mais polícia?) e lutar apenas pela efetivação da lei Maria da Penha acabam por não contribuir em nossa luta para acabar com o machismo, que passa inevitavelmente pela luta contra o sistema capitalista. A luta contra a violência não pode apontar no sentido de gerar mais ilusões no regime burguês ou então de colocar como alternativa a polícia que mata nas favelas, estupra, reprime as manifestações e desaparece com os Amarildos de nosso país. Acreditamos que devemos colocar um forte combate, exigindo sim como mínimo a implementação da Lei Maria da Penha, mas isso deve estar acompanhado pela organização das mulheres em seus locais de trabalho e estudos, pra que todos os Sindicatos e Centros Acadêmicos organizem Comissões ou Secretarias de Mulheres que tratem dos temas de violência “doméstica” a partir de amplas campanhas que demonstrem que não se trata de um problema “que não se mete a colher”, mas de uma questão social que toda a classe trabalhadora deve tomar pra si.

Achamos importantíssimo combater o machismo do dia a dia nas universidades e escolas, que cumprem um papel social de correio de transmissão da ideologia burguesa, que reproduz todos os valores machistas, homofobicos e racistas para perpetuar a divisão entre os trabalhadores e manter a produção do conhecimento a serviço dos capitalistas. Desde as calouradas nas universidades, o conteúdo das aulas nas escolas, as piadas do dia-a-dia, os eventos de “Miss Bixete” e outros, achamos é preciso atuação cotidiana e consequente para combater em todos os âmbitos as expressões do machismo e sua raiz.

Para responder sobre a precarização do trabalho, como uma das formas da precarização da vida das mulheres, travestis e transexuais, achamos que para além de lutar por “igual trabalho, igual salário”, seria indispensável a luta contra a terceirização, que, no momento em que estamos que ainda tentam aprovar uma ampliação dessa precarização, com a conhecida “Lei Mabel”, defender concretamente os setores oprimidos, negros, LGBTs e mulheres é preciso levantarmos de forma consequente: efetivação de todos os terceirizados, sem a necessidade de concurso para cargos públicos. Pois, somente acabando com a terceirização – e tendo um programa que a ataque diretamente – é que podemos garantir efetivamente um salário igual para todos os trabalhadores, principalmente as mulheres. E que não fosse imposto o concurso público, pois sob o contrato de terceirizados realizam já o trabalho que realizarão quando forem efetivados. Não permitiremos que tirem nossos trabalhos, com justificativas como estas.

Para combater a dupla jornada de trabalho, é preciso termos claro que foram séculos para consolidar os trabalhos domésticos como trabalhos naturais das mulheres. Que a serviço de custear o gasto da vida dos trabalhadores, as casas se industrializaram com máquinas menores para reprodução individual das famílias. Que são responsáveis por si mesmas em sua subsistência. As mulheres trabalhadoras além de terem de vender sua força de trabalho por horas sem ter acesso ao que produzem - apenas a um salário de fome -, ainda tem que realizar todas as demais tarefas domésticas para a subsistência de si mesma e toda sua família. É preciso que gritemos Basta de Trabalho gratuito! Que ampliemos nossa exigência não apenas para as creches, mas também para lavanderias e restaurantes públicos, gratuitos e de qualidade, para que o Estado e os patrões tenham de arcar integralmente com nossos custos de vida.

Sobre o direito ao aborto, achamos necessário reafirmar essa demanda histórica durante este encontro, pois o índice de mortes por abortos clandestinos só tem aumentado e segue sendo a 4º principal causa de morte materna em nosso país. Mas ainda pior, esse ano, para além de todas as mulheres que já morrem (chegando a totalizar 200.000 mortes), foi o ano em que setores conservadores e religiosos desde o parlamento querem aprovar o projeto da “Bolsa Estupro” como é conhecido, o Estatuto do Nascituro. Esse projeto legitima o estupro e dá mais direitos ao estuprador e ao feto do que as mulheres que são abusadas. Esse absurdo só evidencia a necessidade de ampliarmos nossas forças para lutar pelo direito ao aborto, para que não deixemos mais mulheres mortas na América Latina por falta de saúde publica de qualidade. Que lutemos contra os governos que permitem e impulsionam esses ataques, que vem desde as instituições e o parlamento. Não nos garantem nosso direito a maternidade, com péssimos e escassos serviços públicos, não podem nos impedir de determinarmos nossos próprios corpos e nem tem moral para nos impor mais filhos que não temos condições para criar. Por isso achamos que esse direito precisa ser parte da hierarquia do plano de luta que devemos tirar neste encontro.

Em relação as mulheres lésbicas e as travestis e transexuais, consideramos que o movimento feminista em geral tende a contribuir para a invisibilidade das demandas especificas dessas mulheres e não contribui para forjar uma aliança concreta entre nós que sofremos com o machismo. É preciso que avancemos em discussões profundas sobre esse tema. Como, por exemplo, o projeto de lei Gabriela Leite, defendido pelo deputado do PSOL no Rio de Janeiro, Jean Wyllys, que visa regulamentar a cafetinagem, permitindo o lucro de até 50% sob o comercio de corpos em nosso país. Assim como a precarização, também sofrem com a transfobia que se recusa a emprega-las no mercado de trabalho, sendo fundamental que tenhamos um programa que exija a repartição da jornada de trabalho, para que não tenhamos mais desempregados e nem pessoas capazes de trabalhar sem vagas, servindo como exercito industrial de reserva para baratear os salários médios. 

Os estupros corretivos que atingem diretamente as mulheres lésbicas, que neste ano, se fortaleciam com o discurso homofobico de “cura gay”. Isso nos evidencia que precisamos de uma forte campanha que diga que se já barramos a cura gay, Não permitiremos nenhuma tipo de “correção”, e vamos garantir também que as travestis e transexuais deixem de ser vistas como doentes, com “distúrbio de identidade”.
Por fim, achamos fundamental a partir dos processos abertos no Oriente Médio e em toda Europa, que coloquemos uma discussão sobre a necessidade de um internacionalismo dentro de nosso movimento, que em países como o nosso no Brasil e os países árabes que passam por fortes convulsões de protestos e de exemplos de organização das mulheres (como no Egito que dezenas de milhares se organizam nos atos contra os estupros que vinham sofrendo, na Índia que vão centenas de milhares também contra os abusos e na Síria que diversas mulheres são linha de frente dos enfrentamentos com o governo de Al Assad) que coloquemos uma política séria contra o imperialismo. Assim como desde já denunciemos a intervenção militar que atacará profundamente as mulheres e todo o povo sírio com uma mascara de democracia, como se os EUA que utilizaram armas químicas contra o povo Vietnamita e contra Irã, agora pudessem falar em nome da democracia e dos setores oprimidos. Também denunciamos a opressão Às mulheres afegãs que sofrem com os estupros cotidianamente, bem as tropas brasileiras no Haiti, que nunca devemos deixar de gritar para que saiam deste país, ainda mais pelo fato de serem dirigidas pelo governo brasileiro.

Achamos que seria muito importante resgatar a história das mulheres revolucionárias do século XIX e XX, como Rosa Luxemburgo, Louse Michel, Alexandra Kollontai, e diversas outras que possam nos ajudar a enxergar mulheres que no combate à opressão, se tornaram grandes revolucionárias que conseguiam entender plenamente a relação entre o capitalismo, e a necessidade de derrubá-lo, como a opressão é parte dos pilares que o sustentam.


Por isso, nós mulheres do Pão e Rosas estamos construindo este Encontro em nossos locais de trabalho e estudo como parte de contribuir na organização das mulheres para conquistar nossos direitos e triunfar sob os governos, os patrões e a burocracia sindical. Queremos participar ativamente debatendo nossas divergências e todas as propostas para tirarmos um serio plano de lutas que nos espaços dos movimentos de mulheres que integram a CSP-Conlutas o que pode propiciar a possibilidade de atuações em comum com diversos coletivos e grupos na luta das mulheres.

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